O dia 1 de Março de 2017 marcou a passagem de mais um aniversário da criação da Gapi. São 27 anos investindo para que mais moçambicanos realizem o sonho de empreender com sucesso e desenvolver à si e ao país. Tudo inicia segunda metade da década de 1980, quando se adivinhava o fim do paradigma da economia de planeamento central. Com o início do Programa de Ajustamento Estrutural, os conceitos de economia de mercado e o papel do empresariado nacional entraram no léxico económico corrente dos moçambicanos.
Assim, em 1985 a Fundação Friedrich Ebert (FFE) e o Governo de Moçambique acordaram na realização de um projecto-piloto com enfoque nas pequenas e médias empresas como base para a edificação de uma classe empresarial dinâmica. Surgiu assim um projecto com o nome de GAPI – Gabinete de Apoio e Consultoria a Pequenas Indústrias, que começou a sua actividade em instalações improvisadas, numa garagem.
A Gapi, Lda
A Gapi foi concebida como uma instituição híbrida, realizando uma actividade de fomento que utilizava essencialmente instrumentos financeiros apoiados por um serviço de desenvolvimento de negócios.
Quando em 1987 se iniciou o Programa de Reabilitação Económica (a primeira fase do ajustamento estrutural) os decisores da política económica de Moçambique foram confrontados com a fragilidade da economia de mercado e a insuficiente base empresarial capaz de acompanhar essa reestruturação. Concretamente, não havia capacidade empresarial interna para que as privatizações exigidas pelas recomendações do programa de ajustamento pudessem traduzir-se em empresas mais eficientes e numa utilização mais racional das infra-estruturas e equipamentos nelas existentes.
Em vista dos bons resultados que averbou desde os seus anos iniciais, o GAPI foi identificado como um potencial contribuinte para dinamizar o sector das PMEs. Para lhe conferir uma maior capacidade de intervenção o Gabinete foi convertido em 1990 numa empresa – a Gapi, Lda, com um capital de cerca de USD 70 mil, repartidos entre a FFE (30%) e o Banco Popular de Desenvolvimento (BPD), em nome do Governo Moçambicano, (70%).
O BPD, mais do que contribuir para o capital social da Gapi,Lda, disponibilizou a sua rede nacional de balcões para que os serviços de captação de poupança oferecidos por esta rede e oferta de serviços de crédito pela Gapi,Lda criassem sinergias valiosas mesmo nas zonas mais remotas de um país em fase de finalização de uma guerra.
A Gapi, SARL
Em 1997, dez anos após o início do Programa de Ajustamento Estrutural, entra-se no auge do movimento de privatização das instituições financeiras. Às recomendações de cumprimento obrigatório das instituições de Bretton Woods, na esteira do “Washington Consensus” somava-se a pressão de alguns parceiros internacionais, particularmente aqueles com quem na altura Moçambique negociava importantes pacotes de cooperação. O principal accionista da Gapi – o BPD – foi envolvido por esta onda de privatizações e, no processo, perdeu a vocação enunciada na sua própria designação – a de banco de desenvolvimento. A conversão do BPD no Banco Austral, haveria de acarretar necessariamente, na lógica do momento, a passagem das acções detidas na Gapi,Lda para este novo banco. Apercebendo-se das consequências que esta privatização teria para a Gapi,Lda, a FFE e o Governo, sob proposta dos gestores, encetaram a busca de soluções alternativas.
Assim, concebeu-se converter a Gapi,Lda numa sociedade anónima operando como sociedade financeira com a missão de implementar programas para apoiar o desenvolvimento do sector empresarial privado. Para se garantir a realização desta missão protegeu-se a instituição contra uma privatização forçada e desastrosa. Por isso decidiu-se que os 70% pertencentes ao BPD fossem assumidos pelo Tesouro Nacional na condição deste manter 30% em paridade com os 30% da FFE e garantindo-se que, posteriormente, quando as condições o permitissem se procederia à passagem dos remanescentes 40% a investidores privados, de acordo com a legislação moçambicana. Em resumo, salvou-se a experiência e o conhecimento acumulados na Gapi, garantindo-se a continuidade de uma instituição nacional.
As discussões e negociações que decorreram neste processo, permitiram aprofundar os conceitos de parceria público-privada e a natureza e papel de uma instituição financeira de desenvolvimento na conjuntura específica de Moçambique. Este arranjo foi estabelecido em princípios de 1999 e consagrado no Decreto 29/99, de 4 de Maio, que converteu a Gapi, Lda, na Gapi SARL. Esta instituição público-privada já tinha activos superiores a USD 3 milhões. O Conselho de Ministros decidiu que, para reforçar a capacidade de intervenção da Gapi poderia ser-lhe concedido “o direito à utilização de fundos públicos”. A Gapi,SARL confrontou-se porém com desafios inesperados. A nova direcção do Banco Austral (como herdeiro do BPD) recusa cooperar com a Gapi na prestação mútua de serviços às PMEs. Assim, de um momento para o outro, a Gapi SARL ficou sem rede nacional e confinada à zona sul, mais próxima da sua sede. Este situação gerou uma concentração da carteira de operações de crédito nesta zona. Coincidentemente ocorreram as devastadoras cheias de 2000 e 2001, afectando principalmente a zona sul destruindo parte significativa da importante carteira de clientes no sector agrícola. Estas dificuldades foram exacerbadas com as expressivas desvalorizações da moeda nacional neste período, que se reflectiu numa correspondente desvalorização dos activos financeiros da instituição.
A Gapi foi capaz de reagir e reestruturar-se. Concebeu novos programas (dos quais se destacou o apoio à reinserção sócio-profissional de 12 mil trabalhadores dos CFM) . Assim, desconcentrou riscos e criou a sua própria rede a nível nacional autónoma e capacitada para dar um melhor suporte ao surgimento das PMEs. Os parceiros que, tendo sido influenciados por esta conjuntura adversa, duvidando da sustentabilidade e continuidade da Gapi e que, por algum momento, retiraram a sua participação em programas conjuntos, voltaram a integrar-se nas iniciativas da Gapi e a participar no seu financiamento.
A Gapi-SI
Com as discussões encetadas no quadro da Conferência Internacional de Monterrey de 2002, e a necessidade de se criar a nível mundial uma abordagem aos problemas de desenvolvimento que não fosse asfixiante como a decorrente do “Washington Consensus” os gestores da Gapi tiveram autorização dos accionistas para repensar a estratégia da instituição.
Em 2003 começou-se a trabalhar na definição de uma estratégia de desenvolvimento institucional assente numa visão de longo prazo na qual Moçambique pudesse contar com um instrumento financeiro capaz de suportar de forma combinada as suas políticas de redução da pobreza e fomento empresarial. O encorajamento dado pelo Conselho de Ministros, em 2005, à reestruturação da Gapi criou as bases para a consumação da parceria público-privada que havia sido prevista no Decreto 23/99 com o Estado a reter a sua participação de 30% do capital da Gapi e incentivando a participação na Gapi de investidores privados. No dia 12 de Dezembro de 2006, os accionistas da Gapi SARL, designadamente o Estado e Fundação Friedrich Ebert deliberaram que as acções em reserva (40%) fossem vendidas à GapiGest SARL (investidores privados), e aos GTT’s (gestores). Por seu turno, e entendendo, neste quadro, que a sua participação como accionista já não era fundamental, a FFE celebrou acordos para vender as suas acções na Gapi (30%) a organizações representativas da sociedade civil, assegurando-se assim que a Gapi passasse a ser uma entidade com um capital detido a 100% por entidades nacionais numa equilibrada combinação de interesses públicos e privados.
Em Julho de 2006 o Conselho de Ministros alterou o Regulamento da Lei das Instituições de Crédito, ( Decreto 31/2006) o qual conferiu à categoria jurídica das “Sociedades de Investimento” a possibilidade de mobilizar recursos através de fundos recebidos de entidades nacionais e estrangeiras sob a forma de donativos ou reembolsáveis, destinados ao financiamento de projectos e programas inseridos em estratégias de desenvolvimento. Esta deliberação deu enquadramento legal para que o Decreto 23/99 pudesse ser implementado no quadro do sistema financeiro.</p?
Acto contínuo, os accionistas da Gapi submeteram ao Banco de Moçambique o projecto de conversão da Gapi numa Sociedade de Investimento, para que se assegurasse o devido enquadramento legal à operacionalização da Gapi como instituição financeira de desenvolvimento. O projecto foi aprovado e a 13 de Setembro de 2007, realizou-se a escritura da Gapi-Sociedade de Investimento – Gapi-SI.
Desde então o país viu inscrita no sistema financeiro nacional a sua primeira Instituição Financeira para o Desenvolvimento (IFD), e com fundos próprios que ultrapassam os USD 9 milhões.
Os novos desafios
Os accionistas estabeleceram as linhas gerais da actuação da Gapi-SI através de uma missão assim definida: “Conceber e implementar programas e projectos que, de forma integrada, estimulem a expansão, diversificação e consolidação do (i) tecido empresarial nacional e (ii) do sistema financeiro moçambicano.”
A realização desta missão carece agora de uma actualização do Plano Estratégico da Gapi, bem como do aumento do seu Capital Social. Estes processos têm estado pendentes da estruturação accionista conforme acordado em 2006.
Entretanto, desde 2012, e na sequência de um diagnóstico feito por uma equipa de consultores, foram propostas as seguintes principais linhas de intervenção:
- Empreendedorismo: Intervenções no âmbito do empreendedorismo através de projectos que combinem a prestação de serviços financeiros com serviços de desenvolvimento de negócios e o desenvolvimento de instituições de enquadramento e apoio aos empresários de pequena escala;
- Inclusão Financeira: Assistência técnica e investimentos em organizações de intermediação financeira baseadas na comunidade (ASCAS, OPEs, …) ou com o cáracter de bancos rurais focalizados nos mercados locais.
- Capital de Risco e Garantias: Financiamento com instrumentos de tomada de riscos – capital de risco e garantias partilhadas – destinados a facilitar o processo de capitalização de iniciativas empresariais de pequena escala.
A nível do tecido empresarial nacional uma atenção especial terá de ser prestada aos sectores relevantes na produção de alimentos, bem como a iniciativas empresariais de jovens e mulheres.
A Gapi-SI tem agora como objectivo estratégico “a mobilização de recursos para que, de forma descentralizada por todo o país, se promova o empresariado nacional e a melhoria das condições para o seu sucesso.”
Para assegurar esse sucesso os accionistas da Gapi-SI terão de capitalizar a sociedade e, junto de terceiros, incluindo o Estado de Moçambique, mobilizar recursos financeiros adicionais que permitam à instituição fazer face à crescente demanda e oportunidades criadas no âmbito das cadeias de valor em torno dos megaprojectos.
Por outro lado, a Gapi tem também de fazer face à crescente concorrência por parte de organizações apoiadas por doadores e que, sem pagarem impostos, nem estarem submetidas aos mesmos regimes de controlo prudencial por parte da autoridade reguladora competem com ela na mobilização do mesmo tipo de recursos.
É pois esta a Gapi que este ano celebra 27 anos, Investindo no desenvolvimento de Moçambique.