Beneficiários da assistência da Gapi relançam economias locais

Dois anos depois do Idai e Kenneth

Poucas semanas após a passagem dos ciclones Idai e Keneth, que em março de 2019 fustigaram e causaram danos avultados nas províncias de Sofala, Manica, Zambézia, Cabo Delgado e Nampula, a Gapi desencadeou um programa de assistência a micro e pequenos negócios vítimas da tragédia. “Hoje, apesar dos limitados recursos de que dispúnhamos, os resultados da prontidão com que respondemos são visíveis e comprovam a eficácia do nosso modo de intervir” – recordou Adolfo Muholove, presidente da Comissão Executiva da Gapi por ocasião da passagem do segundo aniversário daquela calamidade.

A pronta intervenção da Gapi foi feita através de um programa de assistência técnica e financeira, no qual se incluiu um instrumento de crédito especial designado FEREN – Fundo de Emergência e Reabilitação Económica – envolvendo uma parceria da Gapi com a FAN e a CTA, com o apoio da Danida. No global o FEREN foi dotado de recursos na ordem de quase um milhão de dólares.

Desde o início estávamos cientes que a dimensão dos recursos de que dispúnhamos era insuficiente para as necessidades criadas pela tragédia Idai&Kenneth. Mas não ficámos parados. Concebemos um conjunto de iniciativas com vista a mostrar a outras instituições e potenciais parceiros os caminhos para intervir em situações como aquelas. Fomos pioneiros. Fizemos o nosso papel. Era esperado que outras entidades dessem seguimento” – acrescentou o PCE da Gapi.

As declarações de Adolfo Muholove foram feitas durante uma sessão de reflexão organizada por ocasião do 31º aniversário desta instituição que se assinala neste mês de Março. Ao longo dos próximos meses os gestores da Gapi vão continuar a auscultar os seus parceiros e clientes sobre o papel e a estratégia desta instituição financeira de desenvolvimento face aos desafios que o país enfrenta para uma maior inclusão social e económica.

Visitando os lugares afectados, nota-se que as cerca de três dezenas de beneficiários da intervenção do FEREN, conseguiram recuperar e relançar os seus negócios. Infra-estruturas anteriormente destruídas, ressurgiram fruto da intervenção financeira, através de financiamento e também de assistência técnica aos beneficiários.

No processo de implementação do FEREN foi também estabelecida uma parceria com o FARE – Fundo de Apoio à Reabilitação Económica – o que possibilitou a aplicação dos créditos concedidos a taxas de juro na ordem dos 10 a 12,5 por cento.

Assistência humanitária e resgate da pequena economia local

Aquando da ocorrência do ciclone Idai, a Gapi desdobrou-se em acções, com vários parceiros, para mitigar o sofrimento, apoiar a recuperação dos pequenos negócios e reconstruir outros. Primeiro com a Fundação Fernando Leite, identificou as prioridades humanitárias. Do FEREN foram alocados três milhões de meticais, destinados à reconstrução de mercados e apoio ao relançamento dos micronegócios nas zonas afectadas.  O primeiro dos mercados beneficiados foi o Maquinino na Beira, tendo na ocasião o Presidente do Município, Deviz Simango, descrito a iniciativa da Gapi e da Fundação Leite Couto como um “gesto de grande humanismo e compreensão pelo sofrimento dos afectados e sem meios próprios para recomeçarem as suas vidas”

Foi também prestada assistência a municípios e administrações locais para reabilitarem os seus mercados, designadamente em Nhamatanda, Dondo, Búzi, Gorongosa, Caia, Gondola, Sussundengae Nicoadala.

Reforço a resiliência de negócios face aos riscos ambientais

Em parceria com a OIT – Organização Internacional de Trabalho – a Gapi iniciou um projecto focado na melhoria da resiliência das empresas e riscos de novos investimentos face aos principais desafios ligados às mudanças climáticas. A OIT e a Gapi capacitaram gestores de MPMEs e promotores de novos negócios em matérias sobre a resiliência das organizações empresariais e respectivos negócios.

A primeira fase contemplou a formação de formadores em matérias que incluem (i) a identificação do quão resiliente é uma organização; (ii) identificação dos riscos que podem afectar uma organização; (iii) avaliação do nível de vulnerabilidade; (iv) compreensão das prioridades da organização; (v) elaboração de planos de continuidade de negócio após ocorrência de desastres naturais dentre outras.

Testemunhos

2 anos depois, renasci, graças ao FEREN

– Samuel Doliz Miqui, comerciante, Guru, Manica

Samuel Doliz Miqui, de 45 anos de idade, mora na vila sede de Guro, concretamente no Bairro Tseretse Kama B, local onde tem um estabelecimento no qual vende mercadoria diversa que inclui fardos de roupa e de mantas, sacos de chinelos, malas e colchões.

Miqui considera-se, “um sobrevivente que não se conforma com a derrota. Sofri com o Idai que me destruiu tudo. Perdi o meu negócio e a minha mercadoria”. Contactou a Gapi, respondeu às questões que lhe foram colocadas, comprovou como e a dimensão dos prejuízos causados pelo ciclone e, em pouco tempo, obteve um empréstimo no valor de 1.500.000 Meticais

“Esse financiamento foi a minha ressurreição. Com ele me reergui e hoje vendo e abasteço os pequenos comerciantes da urbe e dos Postos Administrativos dos distritos de Guro e Barué. Já reforcei a minha capacidade e adquiro os produtos nas cidades de Chimoio, Beira e Tete” – descreve antes de finalizar – “2 anos depois, renasci, garanto emprego a mais quatro pessoas e tudo graças ao FEREN”.

É um orgulho poder contar com instituições nacionais

– Rosa Botão Macedo, Posto de Venda de Combustível e lubrificantes, Vanduzi, Manica

Quem aporta a vila de Vandúzi, na estrada Nacional Nr 7, certamente conhece o Posto de Venda de Combustível e lubrificantes que durante muito tempo tem sido o “porto seguro” dos automobilistas que por ali passam.

O cliclone Idai quase o fez passar à história. Propriedade da senhora Rosa Botão Macedo de 58 anos e natural de Chibata-Vandúzi, este posto é parte de um conjunto de negócios familiares que inclui actividades de comercialização agrícola e Indústria Hoteleira (Bar/Restaurante), desde os anos 90.

“Após a devastação do Ciclone IDAI, encarei grandes dificuldades financeiras, porque o posto de abastecimento de combustível foi severamente afectado. Tive inundações e o teto desabou. Felizmente tive acesso ao financiamento do FEREN, no valor de 5.000.000 meticais. Reabilitei quase tudo e estou de novo a trabalhar”.

Visivelmente feliz confessa: É um orgulho poder contar com instituições nacionais para nos apoiarem nos negócios. A minha maior satisfação é dar emprego a chefes de nove famílias e ver todos os dias camiões com variados destinos, dentre nacionais e estrangeiros, a abastecerem nesta empresa que lutamos por manter há cerca de 30 anos”.

Com o FEREN as sementes da Zembe voltaram ao mercado

-Companhia de Zembe, Manica

A Companhia de Zembe, uma empresa criada em 2011 que multiplica, processa e comercializa sementes certificadas através dos vários Agro-dealers, o FEREN foi o balão de oxigénio.

Com a passagem do ciclone Idai, os meios da empresa ficaram bastante destruídos e viu-se mergulhada numa crise material e financeira. Uma grande parte das culturas em campo foram devastadas; parte da fábrica/armazém cedeu pela fúria dos ventos e os equipamentos de processamento ficaram mergulhados nas águas das chuvas e ao sol por dias ininterruptos, acelerando a sua degradação.

Com o financiamento do FEREN, na ordem dos 5.000.000 de meticais, a Companhia do Zembe está de novos operacional e salvaguardou os 21 postos de trabalhos diretos, além dos mais de 40 produtores espalhados ao longo da província cuja actividade depende do abastecimento feita dos por esta empresa especializada.

Sem este apoio, a “Agro Ana” estaria falida

– António Norberto Assane, Agro Ana, Nhamatanda

“Para mim o FEREN foi uma tábua de salvação, sem a qual, estaríamos falidos” – diz António Norberto Assane, sócio gerente da Agro Ana, localizada em Tica, distrito de Nhamatanda, em Sofala. Trata-se de uma empresa que se dedica à produção comercial de cana-de-açúcar, numa área total de 45ha sendo 20ha em Tica e restantes 25ha em Bandua.  

“Sem este apoio, estaríamos falidos, porque não teriamos capacidade financeira para recuperar os equipamentos destruídos, suprir os encargos com o pessoal técnico de campo, bem como as necessidades de fertilização do canavial.

Em 2018, Assane já havia beneficiado de um crédito, com a finalidade de aquisição de duas motobombas e respectivo sistema de rega bem como cobrir despesas com o fundo de maneio. Com os meios de trabalho adquiridos e capital de giro fruto do crédito desembolsado pela Gapi, ampliou a sua área de produção para cerca de 55ha de canavial e aumentou o número de trabalhadores para 70, o que permitiu alcançar um rendimento para 80ton/ha.

Com a destruição causada pelo Idai, no qual perdeu tudo, António Assane viu-se a beira da falência, tendo recorrido, mais uma vez ao financiamento. Contactou a Gapi que, através do FEREN, lhe concedeu um empréstimo no valor de 1.500.000 meticais. “Este valor serviu para a reposição dos danos causados pelo ciclone IDAI, que afectaram severamente o canavial tendo causado a perda e/ou redução da qualidade dos níveis de sacarose da cana; reposição do equipamento perdido, bem como a recuperação da área do canavial e recontratação do pessoal efectivo”.

Soaves: FEREN reergue respeitado avicultor

Os ventos com 200kms por hora que em março de 2019 se abateram sobre os aviários da Soaves em Manica, devastaram grande parte da infra-estrutura de uma empresa de sucesso no ramo avícola sedeada em Gondola. Também nos seus armazéns da Beira, uma grande quantidade de todo o frango congelado pronto para o mercado ficou destruído após dias sem energia.  

No gabinete da delegação da Gapi, Ibrahimo Abdula relatou a desgraça em que se encontrava o negócio que tempos antes a Gapi tinha apoiado e promovido. Esta empresa vinha conhecendo anos de estabilidade e crescimento contínuo, fruto do investimento realizado. Antes do Idai, e para contornar o elevado custo da ração e a elevada demanda desse insumo derivado do alto volume de produção, montou uma indústria de processamento de milho para a produção de ração para as aves. Paralelamente, montou uma pequena unidade de processamento e ensacamento de ração.

Com esta estrutura a empresa constituiu uma cadeia produtiva completa e assim se tornou um dos principais e respeitados avicultores da região centro do país dando emprego directo a três dezenas de trabalhadores.

Reconhecendo a seriedade e capacidade deste empresário moçambicano, em poucos dias, o FEREN concedeu-lhe um financiamento de 5 milhões  de meticais. Em poucas semanas a Soaves reiniciou a sua actividade e está a realizar os seus planos de recuperação da produção.

Nelito: de Agro-Jovem inovador a resiliente face ao Idai

Nelito Chavanha é um jovem agricultor de Manica que, tendo beneficiado do programa Agro-Jovem foi eleito pela Direcção da Gapi como o melhor empresário jovem, da época agrícola 2018/19, dedicando-lhe o prémio “Combatente pelo Desenvolvimento”, pelo seu empenho, responsabilidade perante os compromissos financeiros e capacidade de resiliência no desastre do Idai

Nelito foi agraciado pelo facto de, mesmo após ter sofrido com o ciclone Idai, ter-se reerguido da destruição parcial da sua infra-estrutura e, mesmo nessas condições, ter conseguido assegurar o cumprimento das suas obrigações financeiras para com a Gapi-SI.

De 33 anos, residente no distrito de Vandúzi, Nelito é especializado em Agro-negócios pelo Instituto Superior Politécnico de Manica. Em 2013 iniciou com a produção e venda de plântulas e hortícolas, além de trabalhar no fomento de produção, fornecendo semente e assistência técnica a diversos produtores locais.

Nelito, mesmo sem deter garantias reais sólidas, recebeu em 2017 um financiamento no âmbito do programa agro-jovem , que investiu em infra-estruturas de produção adaptadas a algumas mudanças climáticas, bem como na aquisição de tecnologias melhoradas para a sua produção.

Além do processo de certificação dos seus produtos, este jovem vem se destacando na produção orgânica, isto é, produção sem uso de agroquímicos, sendo um dos poucos empreendedores nesse processo. “Temos como perspectiva, consolidar a produção orgânica, através de produção local de adubos, pesticidas e inseticidas, abranger maior número de produtores, no fornecimento de plântulas, possuir todos os produtos certificados, com selo made in Mozambique e ser uma referência na produção de Alface de variedades diferentes durante todo o Ano.” – Assegura.

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